quinta-feira, 18 de outubro de 2007

O BOTO


Reza a lenda que o boto costuma perseguir as mulheres que viajam pelos rios e inúmeros igarapés; às vezes, tenta virar a canoa em que elas se encontram, e suas investidas se acentuam quando percebem que há mulheres menstruadas ou mesmo grávidas.

Ele, o boto, é o grande encantador dos rios. Transformando-se num guapo rapaz, todo vestido de branco e portando um chapéu, para esconder o furo no alto da cabeça, por onde respira, ele percorre as vilas e povoados ribeirinhos, freqüenta as festas e seduz as moças, quase sempre as engravidando. Há, inclusive, histórias em que a moça é fecundada durante o sono...

Para se livrarem da "influência" do bicho, os caboclos vão buscar ajuda na magia, apelando para os curandeiros e pajés. O primeiro, com suas rezas e benzeduras, exorciza a vítima, e o segundo "chupa" o feto do ventre da infeliz. É esse Dom Juan caboclo, o sedutor das matas, o pai de todos os filhos cuja paternidade é "desconhecida", o que deu origem à expressão regionalista: "Foi o boto, sinhá!" A credibilidade no mito é tamanha que há casos de pescadores perseguindo e matando o pobre cetáceo, por achá-lo responsável pela gravidez indesejada de suas filhas ou mulheres.

IARA

Mito baseado no modelo das sereias dos contos homéricos, a Iara é a Vênus amazônica; é uma ninfa loira de corpo deslumbrante e de beleza irreversível. Sua voz é melodiosa, e seu canto, tal como no original grego, é capaz de enfeitiçar a todos que o ouvem, arrastando-os em sua direção, até o fundo dos rios, lagos, igarapés, etc., onde vivem esses seres fabulosos. Na Amazônia, o tapuio que escuta o cantar da Iara fica "mundiado" e é atraído por ele; o mesmo se dá com as crianças que desaparecem misteriosamente. Crêem os ribeirinhos que essas crianças estão "encantadas" no reino da "gente do fundo". Lá o menino é instruído no preparo de todos os tipos de puçangas e remédios. Ao fim de sete anos, durante os quais foi iniciado nas artes mágicas, na manipulação de plantas e ervas, etc., o jovem pode retornar para junto dos seus, tornando-se, geralmente, um grande xamã, um medicine-man.

CAAPORA

O caapora apresenta-se como um moleque pretinho, que cavalga porcos selvagens; mas também pode ser descrito como uma caboclinha de longos cabelos, duros feito espinhos, e que, em troca de tabaco, é capaz de dar ao caçador tanto a caça que ele deseja quanto o próprio sexo.

Os índios e caboclos acreditam que, prendendo um caapora, ele é obrigado a conceder um "poderzinho" ou atender a um desejo, em troca da liberdade. A armadilha para capturá-lo e a isca utilizada consistem apenas numa cuia e aguardente. Derrama-se a cachaça na cuia, que deve ser colocada num lugar onde ele já tenha aparecido, ou no local onde tenha sido chamado previamente. Depois de ter bebido a cachaça, torna-se presa fácil para qualquer um, porém até hoje ninguém conseguiu tal façanha.

Apesar de, em alguns casos, essa entidade aparecer como má e vingativa, a versão geral é a de que ele é um duende protetor da floresta e da caça. Daí alguns autores o identificarem com o curupira.

MAPINGUARI

Esta criatura é descrita como um macaco de tamanho descomunal, - 5 a 6 metros -, peludo como o porco-espinho, "só que os pêlos são de aço".
Em uma versão, o mapinguari tem um só olho, enorme, no meio da testa, e uma bocarra vertical que desce até o umbigo.

Cada passo do mapinguari mede três metros, e seu alimento favorito é a cabeça das vítimas, geralmente pessoas que ele caça durante o dia, deixando para dormir à noite. Há aqueles que afirmam ser impossível matá-lo: é invulnerável. Numa outra versão, ele é apresentado como um ser dos mais fantásticos, com dois olhos, mas "três bocas", sendo uma debaixo de cada braço e a outra sobre o coração. Esta última é considerada seu "calcanhar-de-aquiles", pois, quando ele abre a boca, pode-se acertar seu coração, única maneira de matá-lo.

CURUPIRA

Na teologia indígena, o curupira apresenta-se como um moleque de aproximadamente sete anos, com o corpo coberto de longos pêlos e tendo os pés virados para trás. As primeiras informações foram registradas pelos portugueses, nos primeiros séculos do Descobrimento, e desde aquela época é visto como um ente maléfico, um demônio ou um mau espírito.

As informações também são as mais diversas: ora é um duende benfazejo, ora um demônio mau; ora um gnomo ou um ogro. O ponto em que todos são unânimes é quanto à sua condição de deus autóctone das selvas, um protetor.

Há no Brasil versões em que o curupira aparece com avantajado órgão sexual, que utiliza como tacape. Conta-se que durante as tempestades ouve-se um bater nas sapopemas e troncos de grandes árvores. É o curupira, que, com o próprio e descomunal membro, verifica se elas estão em condições de agüentar os fortes ventos. Noutra versão ele se utiliza de uma pesada maça ou clava, ou do próprio calcanhar, que é para a frente.

Como protetor das florestas, castiga impiedosamente aquele que caça por prazer, que mata as fêmeas prenhas e os filhotes indefesos, mas ampara o caçador que tem na caça o seu único recurso alimentar, ou que abate o animal por verdadeira necessidade. Também protege os pescadores que se aventuram nos incontáveis rios, igarapés, etc., durante o período das chuvas, mais fortes entre os meses de novembro e maio.

JURUPARI

Jurupari é a denominação tupi para um demônio particular, mas foi usada com exclusividade pelos missionários para designar qualquer demônio, até assumindo o lugar do cristão nos trabalhos de catequese dos íncolas.

A lenda diz que o jurupari é um deus que veio do céu em busca de uma mulher perfeita para ser esposa de Coaraci, o Sol, mas não diz se ele a encontrou. Jurupari foi o maior legislador que os indígenas conheceram, assemelhando-se a Quetzalcoalti, a "Serpente Emplumada", deus reformador e legislador maia.

Enquanto conviveu com os homens, estabeleceu uma série de normas de conduta e leis morais, instituiu a monogamia, a higiene pessoal, através da depilação corporal, restituiu o poder aos homens que viviam em regime matriarcal, promoveu modificações nos costumes e na lavoura, instituindo, especialmente, as festas de colheita.

Algumas das leis do jurupari permanecem válidas até hoje e são as seguintes:
o chefe cuja mulher for estéril poderá tomar outras para si, sob pena de perder o trono para o mais valente;

ninguém cobiçará a mulher do outro, pagando a desobediência com a própria vida;
a mulher deverá permanecer virgem até a puberdade e jamais se prostituir;
a mulher casada deverá permanecer com o marido até a morte, sem traí-lo;
o marido deverá permanecer em repouso durante uma lua, após o parto da mulher;
o homem deve sustentar-se com o trabalho de suas mãos;
é punida com a morte a mulher que vir o jurupari e o homem que revelar seus segredos e seus rituais.

A cerimônia do jurupari tem seu ritual em fins de março, coincidindo com o período em que as águas diminuem e prenunciam o verão, que começa em maio. Na verdade, na Amazônia não existem inverno nem verão. O que chamamos de inverno e verão é caracterizado pelas chuvas, abundantes num e escassas noutro período.

MACUNAÍMA

Macunaíma é um misto de deus e herói lendário do extremo norte da Amazônia, alto Rio Branco, área do grupo Aruaque. Tal como jurupari, este também é um enviado dos céus. Converteu tronco de madeira em gente e bichos.